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quinta-feira, 1 maio, 2025
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Experimento dividiu comunidade científica sobre nossa consciência

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A busca por entender a consciência humana tem gerado mais teorias do que respostas claras no campo da neurociência. “Na área da consciência, já existem tantas teorias que não precisamos de mais“, afirma Oscar Ferrante, neurocientista da Universidade de Birmingham (Inglaterra), ao The New York Times. Uma pesquisa de 2021 identificou 29 teorias diferentes sobre o tema.

Projeto que buscou a pacificação

Em 2018, um grupo ambicioso de cientistas liderado por Lucia Melloni, do Instituto Max Planck para Estética Empírica, decidiu adotar abordagem inovadora. “Não somos incentivados a abandonar nossas próprias ideias“, reconheceu Melloni, que reuniu 41 cientistas para formar o Consórcio Cogitate.

A proposta era revolucionária: uma “colaboração adversarial“, onde defensores de teorias rivais trabalhariam com pesquisadores neutros para testar suas hipóteses simultaneamente. O consórcio selecionou duas principais teorias para o confronto:

  • Teoria do Espaço Neuronal Global: Desenvolvida por Stanislas Dehaene, defende que a consciência surge quando regiões frontais do cérebro transmitem informações sensoriais para todo o órgão;
  • Teoria da Informação Integrada: Criada por Giulio Tononi, propõe que a consciência resulta do processamento complexo de informações em diferentes compartimentos cerebrais que se integram para formar uma experiência unificada.
Cérebro humano sobrecarregado
Cérebro humano ainda tem grandes mistérios a serem desvendados (Imagem: SOLDATOOFF/Shutterstock)

Experimento ambicioso

Durante dois anos, os pesquisadores planejaram meticulosamente o experimento. A partir de 2020, examinaram 267 voluntários em oito laboratórios distribuídos por Estados Unidos, Europa e China.

Os participantes jogaram videogames projetados para medir sua percepção consciente. Em um deles, deveriam capturar discos coloridos em movimento e indicar quando notavam um rosto desfocado atravessando a tela. Para garantir resultados abrangentes, utilizaram três técnicas diferentes:

  • Eletrodos inseridos temporariamente no cérebro de pacientes com epilepsia;
  • Ressonância magnética funcional (fMRI, na sigla em inglês) para medir o fluxo sanguíneo cerebral;
  • Magnetoencefalografia para registrar campos magnéticos do cérebro.

Resultados e controvérsia

Em 2022, a análise dos dados revelou que ambas as teorias fizeram algumas previsões corretas sobre o funcionamento cerebral durante experiências conscientes, mas, também, apresentaram falhas significativas. “Ambas as teorias estão incompletas“, concluiu Ferrante.

Quando Lucia Melloni apresentou os resultados em conferência em Nova York (EUA) em junho de 2023, a reação foi explosiva. O artigo do consórcio, submetido à Nature, recebeu duras críticas de revisores.

Hakwan Lau, neurocientista da Universidade Sungkyunkwan (Coreia do Sul) e defensor de sua própria teoria da consciência, liderou as críticas. Ele questionou, publicamente, se o projeto, realmente, testava as teorias adequadamente e ajudou a redigir uma carta aberta criticando tanto o experimento quanto a Teoria da Informação Integrada.

O grupo “IIT-Concerned“, com 124 especialistas signatários, classificou a Teoria da Informação Integrada como pseudociência, argumentando que suas implicações (como a possibilidade de plantas terem algum nível de consciência) são absurdas.

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Impacto na comunidade científica

A publicação da carta, em setembro de 2023, desencadeou intenso debate nas redes sociais e revistas científicas. Tononi e seus colegas responderam duramente, afirmando que a carta dos críticos “tinha muito fervor e poucos fatos“.

Quando o artigo do Consórcio Cogitate foi finalmente publicado na Nature, continuou dividindo opiniões. Anil Seth, neurocientista da Universidade de Sussex (Inglaterra), elogiou a escala do estudo e suas descobertas sobre as deficiências de cada teoria: “É um trabalho tremendo.”

Por outro lado, os críticos mantiveram sua posição. Joel Snyder, psicólogo da Universidade de Nevada (EUA), afirmou que o experimento não era um teste preciso de nenhuma das teorias, pois suas previsões poderiam ser geradas também por outras teorias.

Futuro da pesquisa sobre a consciência

Apesar das controvérsias, Seth ainda vê valor em confrontar teorias, mesmo que isso não leve os cientistas a abandonarem suas próprias ideias. “O melhor que podemos esperar de uma colaboração adversarial bem-sucedida é que outras pessoas possam mudar de opinião.”

Ilustração digital de de inteligência artificial em forma de um cérebro humano estilizado com circuitos eletrônicos brilhando em azul, flutuando em um ambiente surreal de grades quânticas e partículas entrelaçadas
Experimento ambicioso estudou pessoas por dois anos (Imagem: Pedro Spadoni via DALL-E/Olhar Digital)

O estudo talvez não tenha reduzido a lista de teorias da consciência, mas, certamente, demonstrou que, quando se trata de entender como surge nossa experiência subjetiva do mundo, o debate científico pode ser tão complexo quanto o próprio fenômeno estudado.




Fonte: Olhar Digital

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