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terça-feira, 24 dezembro, 2024
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Troca de comando na PF do Amazonas pode resultar em manobra política para frear investigações contra o crime organizado na região.

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A troca de comando na Polícia Federal no Amazonas preocupa organizações indígenas e de direitos humanos, pois pode resultar na transferência de inquéritos que ora são instaurados em Brasília, para o âmbito local. É o caso dos inquéritos que investigam o massacre no rio Abacaxis, em 2020, e as mortes dos indigenistas, Maxciel dos Santos, em 2019, e Bruno Pereira e do jornalista, Dom Phillips, em 2022.

Organizações indígenas do rio Javari e Solimões publicaram, no último dia 28 de agosto, nota à imprensa informando que o delegado da Polícia Federal, Umberto Ramos Rodrigues, que chefiava a superintendência da Polícia Federal, no Amazonas, foi substituído pelo delegado, Paulo Garrido Pimentel, que é quem passa a responder pelo órgão na região. A nota já foi divulgada em portais internacionais, como o The Guardian.

O jornal britânico publicou ontem uma nota sobre a troca de chefes, na polícia, afirmando ter gerado um estado de choque para os que aguardam justiça, pois a mudança era inesperada e representa um retrocesso, nas investigações desses crimes. Em nota à imprensa, organizações indígenas como a Univaja e de defesa dos Direitos Humanos, alertam para o fato de que a redistribuição dos inquéritos que estavam sob investigação, em Brasília, pode ter um viés político, já que autoridades do alto escalão amazonense estão sob investigação.

“A redistribuição do inquérito a outro delegado só prejudica as investigações, que avançam com a possível elucidação dos crimes e tem como alvos, possivelmente, autoridades amazonenses que dão sustentação às práticas criminosas no Estado, o qual ostenta a terceira posição em criminalidade do País”, declara o manifesto das organizações.

A nota declara haver desconfiança quanto a substituição do delegado à frente das investigações porque afirma virem acompanhado de perto os excelentes resultados, no combate ao crime organizado na região. “Entendemos que se trata de manobra aberta, sorrateira, graças ao grande poderio e influência política e econômica dos indiciados e demais envolvidos, para impedir a finalização das investigações e promover retaliação ao Delegado atual, que vem cumprindo com o dever da atribuição do cargo e está prestes a finalizar o inquérito”.

Disputa pelo pleito municipal

Para as organizações, não há razão de interesse público que justifique tais modificações, por isso, a desconfiança. Além disso, com o avizinhamento do pleito municipal – oportunidade em que se reconfigura o cenário político de 2026 – a redistribuição do inquérito pode estar ocorrendo por meio de interferências políticas, nessa conjuntura.

As organizações indígenas e de direitos humanos da região atuam para garantir que a obrigação do Estado Brasileiro em garantir a isenção e a transparência, nos inquéritos abertos pela Polícia Federal, seja cumprida. Elísio Marubo, advogado da Univaja, associação indígena onde atuava Bruno Pereira, afirmou ao The Guardian que a troca de delegados foi “um grande passo para trás”.

A Univaja ressalta na nota que vem cobrar as responsabilidades do Estado Brasileiro perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), por meio da cautelar 449-222. Entre as urgências, destacadas nos documentos vigentes, encontra-se exatamente a garantia das investigações, a isenção e a transparência nos inquéritos, que buscam a verdade acerca dos assassinatos, envolvendo Maxciel dos Santos, Bruno Pereira e Dom Phillips. “A autoridade nacional permanece em falta. Tal fato está sendo denunciado à CIDH”, segundo a nota.

Frente de resistência

O Coletivo Pelos Povos do Abacaxis surgiu em agosto de 2020, para fazer resistência ao massacre ocorrido na região dos rios Abacaxis e Mari-Mari, entre Borba e Nova Olinda do Norte. Composto por várias organizações da sociedade civil, dentre as quais o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Frente Amazônica de Mobilização e Defesa dos Direitos Indígenas (FAMDDI), o Grupo de Pesquisas DABUKURI/UFAM, a Casa da Cultura do Urubuí (CACUÍ), o coletivo vem realizando várias estratégias e articulações, inclusive o diálogo com os órgãos responsáveis pela investigação, denúncia e julgamento do massacre no rio Abacaxis.

Após as notícias sobre a troca de comando na Polícia Federal no Amazonas, no dia 22 de agosto e a retirada do Delegado da Policia Federal e da equipe que atuava no caso, em Brasília, o Coletivo divulgou ofício protocolado, na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), e encaminhado ao Ministério da Justiça, em maio de 2023, informando que as investigações sobre o caso, que indiciou o ex-secretário de segurança Louismar de Matos Bonates e o ex-Comadante-geral da polícia militar do Amazonas, Ayrton Ferreira do Norte, vinham sendo prejudicadas pela troca constante de delegados.

“As investigações vem tendo troca constante de delegados. Já é o 6º que atua no caso. Porém esse último avançou com as investigações e indiciou os maiores autores do massacre, autores das ordens ilegais que resultaram nos crimes bárbaros de tortura e execução sumária, a qual matou 4 (quatro) ribeirinhos, 2 (dois) indígenas Munduruku, torturou mais de 100 pessoas, fez desaparecer outras 2 (duas) pessoas, sitiou e aterrorizou os indígenas Maraguá e Munduruku, e as famílias ribeirinhas”, informa o documento, que obteve a manutenção do Delegado à frente do caso e de sua equipe, em Brasília, em 2023.

Ocorre novamente agora a mesma tentativa de afastar o delegado que vinha à frente dos casos, estando prestes a finalizar as investigações que deve apontar os responsáveis e indiciá-los.O Coletivo vem novamente solicitar que a investigação seja mantida em Brasília como está, em razão da influência perniciosa local que tem potencialidade para ser exercida, vindo o caso para a Superintendência do Amazonas. “Entendemos que se trata de manobra aberta, sorrateira, graças ao grande poderio e influência política e econômica dos indiciados e demais envolvidos para impedir a finalização das investigações e retaliação ao Delegado atual, que vem cumprindo com o dever da atribuição do cargo e está prestes a finalizar o inquérito”.

A solicitação é encaminhada ao Ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, que tem a competência para manter o Delegado atual na investigação, em Brasília. É um apelo para que seja concedida toda a estrutura possível para a polícia federal finalizar os casos em andamento e enviar para o processamento e julgamento pela justiça, especialmente em razão do caso envolver violação aos direitos fundamentais à vida e integridade física e psicológica do Povo Munduruku e Povo Maraguá.

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