Alexandre de Moraes e Bolsonaro (Composição: Lucas Oliveira/Cenarium)
01 de abril de 2025
MANAUS (AM) – Nos últimos anos, a propagação de fake news tornou-se uma das principais ferramentas da extrema direita para manipular a opinião pública e enfraquecer as instituições democráticas. Por meio da disseminação de informações falsas surgiu a teoria da existência de um estado paralelo e ditatorial no Brasil. Nesta terça-feira, 1°, Dia da Mentira, especialistas falaram à CENARIUM sobre como as fake news são usadas para este fim.
O estado paralelo pode ser definido como um “Estado de não-Direito”, que decreta “leis arbitrárias, cruéis ou desumanas“, e no qual o direito é imposto por “chefes“. É um termo comumente usado no contexto de teorias da conspiração, sugerindo que o governo de determinado País é controlado por agentes externos ou impotentes.
Advogado e analista político em Brasília (DF), Melillo Dinis observa que as fake news criam, mais que um estado paralelo, um conjunto de universos paralelos fora da realidade. “São espelhados de forma constante um conjunto de narrativas desprovidas de sustentação na realidade. E as desinformações se sucedem em um jogo em que, além de uma velocidade comandada pelo digital, aposta-se nas Fake Ethics, ou seja, o desejo de acreditar nestas realidades paralelas em forma de crença, som e fúria“, destacou.
Um exemplo disso é a narrativa de agentes políticos da direita, tanto brasileira quanto latino-americana, de que se vive em uma ditadura (um regime não democrático, ou antidemocrático, regido por uma pessoa ou entidade política onde não há participação popular) comandada por “chefes” como o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Em janeiro deste ano, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) — que se tornou réu por tentativa de golpe e outros quatro crimes — afirmou, em entrevista ao programa Os Três Poderes, da Veja, que o Brasil vive uma “ditadura, onde se espera que o ditador saia do Executivo, e sai, agora, por parte de uma pessoa do Judiciário“.
O discurso é seguido por aliados como o filho do ex-presidente Eduardo Bolsonaro (PL/SP), que anunciou, em março, ter se licenciado do mandato de deputado federal para ficar nos Estados Unidos para buscar, no território norte-americano, punição de pessoas que violam os direitos humanos no Brasil. Ele mencionou diretamente Alexandre de Moraes, relator de investigações sobre a trama golpista que envolve o pai e aliados.

Os ataques ao sistema brasileiro também vêm de agentes internacionais, como é o caso do presidente ultradireitista da Argentina, Javier Milei. Em suas redes sociais, o mandatário do País vizinho já compartilhou publicações sobre uma suposta “Ditadura Lula”.
Pesquisa realizada pela AtlasIntel em 2024 mostrou que 47,3% dos entrevistados acreditavam que o Brasil “vivia sob uma ditadura” do Judiciário. Outros 20,9% discordaram e acharam que esse poder cumpre seu papel corretamente. O levantamento também apurou que 16,7% dos brasileiros dizem que não existir uma “ditadura”, mas acham que muitos juízes “cometem abusos e ultrapassam suas atribuições”.
Estado democrático
O advogado e consultor jurídico do Pedro Benedito Maciel Neto observou, no artigo “Não, não vivemos uma Ditadura do Poder Judiciário“, que confiar nas instituições, no Estado e nos seus Poderes é determinante para o progresso de uma nação, e, por essa razão não se pode “conspirar, criticar e desqualificar poderes, congressistas ou ministros apenas porque suas ações não são coincidentes com a nossa maneira de ver o mundo“.
“Honestamente? Estou muito cansado de ouvir — até mesmo de advogados, juízes e promotores —, que ‘caminhamos para uma ditadura’, que o ministro Alexandre de Moraes seria ‘autoritário’. Cansado de ouvir, de incautos e de pessoas de má-fé, críticas sem fundamento ao Judiciário, o qual, na minha percepção, corajosamente garantiu a democracia e impediu um golpe de Estado, engendrado pelo candidato derrotado nas eleições presidenciais de 2022“, citou o consultor.
A declaração de Pedro Benedito Maciel Neto é referente aos ataques pré e pós 8 de janeiro de 2023, quando apoiadores e aliados de Jair Bolsonaro planejaram e colocaram em execução uma série de vandalismos, invasões e depredações do patrimônio público em Brasília (DF), em uma tentativa de derrubar o governo eleito nas eleições de 2022.
Na semana passada, o ex-presidente e outros sete aliados tornaram-se réus após a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitar, por unanimidade, denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) por tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado e outros três crimes.

A advogada e professora universitária no curso de Direito da Uninassau Brasília (DF) Tati Gomes observou à CENARIUM que o fenômeno da desinformação não é algo novo e utilizar o termo “estado paralelo” é buscar dar uma aparência oficial de algo que é para ser tratado à margem da legalidade e, consequentemente, punido independe de quem pratique.
Segundo ela, a disseminação de fake news e a desinformação é passível de punição, e esta deve ser garantida pelo Estado. “Toda e qualquer desinformação é tendenciosa e visa atender os interesses de quem a pratica. Nessa ótica, cabem às instituições que compõem o Estado Democrático de Direito buscarem mecanismo de combate e punição para garantir a estabilidade“, acrescenta.
Revisado por Gustavo Gilona
Fonte: Agência Cenarium