Lideranças da etnia denunciam presença de equipe estrangeira na Terra Indígena Andirá/Marau e pedem ação urgente da Polícia Federal
O apresentador britânico Edward James Stafford, conhecido mundialmente por suas aventuras em ambientes extremos nos canais Discovery, enfrenta agora uma polêmica que pode custar sua liberdade no Brasil. Stafford e sua equipe foram acusados de invadir a Terra Indígena Andirá/Marau, território pertencente ao povo sateré-mawé, localizado entre os municípios de Parintins, Maués e Barreirinha, no estado do Amazonas.
A entrada do grupo estrangeiro se deu por via fluvial, pelo rio Andirá, no município de Barreirinha. Segundo denúncias, a presença da equipe está gerando desconforto entre os indígenas da região e mobilizando autoridades públicas e organizações de proteção aos povos originários.
A Secretaria-Geral do Conselho Geral da Tribo Sateré-Mawé (CGTSM) enviou ofício ao coordenador regional da Funai em Manaus, Emilson Munduruku, solicitando providências urgentes. O documento pede, inclusive, o acionamento da Polícia Federal para que a situação seja investigada.
“Solicitamos que esta Coordenação acione imediatamente a Polícia Federal para averiguar a situação e, se constatada a ilegalidade da presença desses estrangeiros, proceder à retirada imediata dos mesmos do território indígena”, afirma o texto assinado por Herivelto Oliveira, Secretário-Geral do CGTSM.
Além de reivindicar a retirada do grupo, a liderança indígena solicita que os equipamentos da equipe sejam apreendidos e que todas as imagens captadas na região sejam recolhidas. Para Oliveira, o caso configura crime de “biopirataria cultural” — prática que envolve a apropriação indevida de conhecimentos tradicionais e elementos culturais sem o devido consentimento das comunidades originárias.
Sem autorização oficial
A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) confirmou que Ed Stafford e sua equipe não possuem autorização para entrar ou permanecer na Terra Indígena Andirá/Marau. Um dia antes da denúncia formal, a unidade da Funai em Parintins já havia expedido um ofício ao grupo estrangeiro, cobrando a apresentação de documentos que comprovassem a legalidade da estadia na área indígena.
No mesmo documento, a Funai alerta sobre a gravidade da situação:
“Alertamos ainda a Vossas Senhorias que qualquer ingresso de estrangeiros não autorizado em Terra Indígena pela Presidência da Fundação Nacional do Índio e tendo como o aval e ciência da comunidade indígena, se configura como a invasão ilegal, estando, portanto, sujeito às penalidades legais cabíveis”.
Repercussão nas redes e risco de prisão
A presença do apresentador britânico na região repercutiu rapidamente nas redes sociais, com vídeos e relatos de moradores denunciando o que consideram uma invasão ao território protegido. Lideranças indígenas apontam que a equipe não buscou qualquer diálogo com os representantes do povo sateré-mawé e agiu de forma unilateral ao filmar, explorar e registrar imagens na floresta.
Ed Stafford é conhecido por suas produções extremas, como Marooned with Ed Stafford e Ed Stafford: Left for Dead, nas quais passa dias sozinho em ambientes inóspitos. No entanto, desta vez, a busca por aventuras esbarra em normas legais brasileiras e nos direitos constitucionais dos povos originários.
Caso seja comprovada a entrada ilegal em território indígena, Stafford pode ser enquadrado em crime de invasão, com previsão de detenção, além de responder por biopirataria, um agravante diante da possibilidade de exploração indevida de conhecimentos tradicionais e imagens culturais.
Biopirataria e a luta pela soberania indígena
A acusação de biopirataria cultural lançada por Herivelto Oliveira não é um ponto isolado. Nos últimos anos, diversos povos indígenas têm denunciado a apropriação indevida de seus saberes e territórios por estrangeiros que buscam explorar a cultura, a biodiversidade e o patrimônio imaterial da floresta amazônica, muitas vezes sem nenhuma contrapartida ou consentimento.
A legislação brasileira exige que qualquer atividade de pesquisa, filmagem ou exploração em terras indígenas seja precedida por consulta livre, prévia e informada às comunidades afetadas, além de autorização expressa da Funai. A violação desses procedimentos, como neste caso, configura crime e pode ser punida com prisão, multas e até deportação.
Contexto e histórico de Ed Stafford
Apesar do seu reconhecimento internacional como explorador e documentarista, esta não é a primeira vez que Ed Stafford se envolve em polêmicas relacionadas a seus métodos de gravação em territórios tradicionais. Críticos apontam que suas produções, embora tecnicamente bem realizadas, frequentemente ignoram os impactos culturais e ambientais de suas aventuras, especialmente quando realizadas em áreas sensíveis como a floresta amazônica.
No Brasil, a Constituição de 1988 garante aos povos indígenas o direito originário sobre suas terras e a autonomia para decidir sobre o uso e a entrada de terceiros em seus territórios. O não cumprimento dessas normas, principalmente por estrangeiros, representa uma afronta à soberania dos povos indígenas e pode resultar em sanções severas.
A Funai, até o momento, não divulgou se a Polícia Federal já iniciou alguma investigação formal. O CGTSM, por sua vez, afirma que continuará pressionando por medidas mais firmes e transparentes.