BR-319 vista de cima (Aldamir Chíxaro/CENARIUM)
17 de março de 2025
Ailton Krenak, um dos maiores pensadores do Brasil, tem um livro intitulado “Ideias para adiar o fim do mundo”. Nele, o autor critica a relação de exploração da humanidade com a natureza, em que o ser humano, como um parasita, suga tudo o que pode. A partir dessa crítica, ele propõe um repensar, alinhado à visão indígena, em que nós somos a natureza, para, assim, tentarmos evitar a autodestruição. O modo de pensar de Krenak me veio à mente ao refletir sobre nossa reportagem de capa, mas no sentido inverso.
Nesta edição, trazemos instituições que recebem financiamento de fundação internacional, ligada a empreendimentos que exploram a natureza na Amazônia, e endossam narrativas favoráveis à reabertura da BR-319 e ao estímulo a negócios na região. Sendo a estrada um vetor de desmatamento e de possível colapso da floresta, como indicam estudos científicos, estariam tais instituições alimentando ideias para “apressar o fim do mundo”?
A reportagem de capa é resultado de apuração que mostra repasses milionários da Gordon and Betty Moore Foundation (GBMF) a Organizações Não Governamentais (ONGs) e instituições que atuam com projetos voltados a endossar a ideia de uma governança que poderia controlar impactos causados pela reabertura da BR-319. Assim, segundo tal narrativa, seria possível repavimentar a rodovia “gerenciando” a devastação da floresta e assegurando direitos aos povos tradicionais da região, que, pela legislação vigente, precisam ser consultados sobre o empreendimento — algo que, segundo pesquisadores e estudos, não condiz com a realidade.
Há, ainda, ligações com empresas que exploram petróleo e minérios na Amazônia, além de relações entre as instituições e projetos para acelerar negócios na região.
De acordo com pesquisadores e documentos apurados, com a rodovia abre-se caminho para empreendimentos que beneficiam tanto quem endossa a narrativa de governança quanto quem financia tais instituições. Trata-se de um ciclo que se retroalimenta e, segundo os pesquisadores, revela conflitos de interesses.
“É uma distopia: em vez de imaginar mundos, a gente os consome”, diz Ailton Krenak em outro de seus livros, “A vida não é útil”, de 2020. A frase poderia se aplicar ao cenário de nossa reportagem. E, como o próprio Krenak diria, “na economia não existe nada sustentável, porque ela supõe que você vai saquear a terra, você vai tirar coisas. Se você tira e não põe, não é sustentável”.
O assunto foi tema de capa e especial jornalístico da nova edição da REVISTA CENARIUM. Acesse aqui para ler o conteúdo completo.

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Fonte: Agência Cenarium