Um estudo publicado na revista Nature Oncogene nesta quinta-feira (29) pode mudar a forma como cientistas encaram um dos fenômenos mais temidos da biologia: a necrose. Antes vista como etapa final e descontrolada, essa forma de morte celular surge como possível aliada no combate às doenças do envelhecimento. E ainda pode ajudar a superar obstáculos da exploração espacial.
O artigo contou com colaboração de cientistas de diversas instituições renomadas – entre elas, Harvard, NASA e ESA. O objetivo é claro: olhar para a necrose não como o fim, mas como um ponto de partida para descobertas.
Necrose é ‘fronteira esquecida’ que pode mudar tudo
Para Carina Kern, CEO da LinkGevity e autora principal do estudo, a necrose é uma “fronteira esquecida”. “[É] um elo comum entre envelhecimento, doenças, biologia espacial e o próprio progresso científico“, afirma, em comunicado publicado pela University College London (UCL).

O que é necrose?
A necrose ocorre quando células morrem de forma inesperada – normalmente, por infecção, lesão ou doença.
Diferente da morte celular “programada” (organizada e benéfica para a manutenção do corpo), a necrose é caótica. Células se rompem, liberam substâncias tóxicas e inflamam tecidos ao redor.
No centro da necrose está o cálcio. Dentro das células, esse elemento precisa ser rigidamente controlado. Quando ocorre um desequilíbrio, o cálcio entra descontroladamente e causa um “curto-circuito” celular, levando à destruição e à inflamação.
A necrose é especialmente prejudicial nos rins. Para você ter ideia, cerca de metade das pessoas com mais de 75 anos desenvolve algum grau de doença renal. E a necrose está no centro desse processo.
Por que isso importa?
Entender e controlar a necrose pode abrir caminho para novas terapias, argumentam os autores do estudo. A necrose pode ser a chave para interromper ciclos de degeneração que levam a doenças como Alzheimer, insuficiência renal e problemas cardíacos.
Ninguém realmente gosta de falar sobre a morte, nem mesmo da morte celular, o que talvez explique por que a fisiologia da morte é tão pouco compreendida. E, de certa forma, necrose é morte. Se células suficientes morrem, então os tecidos morrem, e então nós morremos. A pergunta é: o que aconteceria se pudéssemos pausar ou interromper a necrose?
Keith Siew, pesquisador da University College London (UCL), em comunicado.
No caso de doenças renais, por exemplo, não importa a causa inicial: inflamação, falta de oxigênio ou toxinas – tudo converge para o mesmo ponto final. “Não podemos impedir todos esses fatores, mas se você puder intervir no ponto da necrose, efetivamente alcançará o mesmo resultado”, explica Siew.
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Necrose no espaço
A necrose também preocupa quem olha para o futuro fora da Terra. Isso porque os rins dos astronautas são particularmente afetados pela microgravidade e pela radiação em missões espaciais. Ou seja, a necrose pode ser um dos principais obstáculos para viagens espaciais prolongadas.

O professor Damian Bailey, da Universidade de South Wales e da ESA, explica e resume bem: “[Controlar] a necrose oferece o potencial não apenas de transformar a longevidade na Terra, mas também de ampliar as fronteiras da exploração espacial.“
Por isso, os pesquisadores correm para descobrir como fazer isso. No fim, o segredo para vidas mais longas e viagens espaciais mais profundas pode estar… na morte.
Fonte: Olhar Digital