O especialista pontuou que os ribeirinhos costumam domesticar animais silvestres (Composição: Paulo Dutro/CENARIUM)
14 de março de 2025
Jadson Lima – Da Cenarium
MANAUS (AM) – A cultura dos povos ribeirinhos da Amazônia de domesticar animais considerados silvestres é forte no Amazonas, apesar das leis brasileiras e normas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) vedarem essa ação. Casos recentes ganharam grande repercussão nacional, como a criação de um filhote de onça-pintada por uma família do município de Santo Antônio do Içá (AM), município localizado a 879 quilômetros de Manaus.
No Dia Nacional dos Animais, celebrado nesta sexta-feira, 14, a CENARIUM conversou com o antropólogo da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Carlos Machado. Cabe destacar que esta matéria não tem o objetivo de concordar ou discordar, mas compreender o porquê a cultura dessas comunidades da Amazônia leva os moradores a adotarem esse tipo de animal.
O especialista pontuou que os ribeirinhos costumam domesticar animais silvestres, porque estão inseridos em outra realidade dos moradores que vivem em cidades grandes. A diferença do que acontece na Amazônia, segundo Carlos Machado, está na escolha do animal escolhidos para a criação, apesar das barreiras encontradas na legislação para esse tipo de domesticação.
“Os ribeirinhos costumam ter animais sob seus cuidados pelas mesmas razões que nós também convivemos com nossos pets. Temos aqui uma diferença importante a ser destacada: os animais que uns e outros costumam selecionar para conviver. Enquanto acreditamos, e escolhemos, que cachorros e gatos mais “normalmente” outras culturas escolhem outros”, declarou.

A defensora de animais Nete Moura também conversou com a CENARIUM sobre o tema. Ela é taxativa: animais silvestres não precisam dos humanos, porque vivem em equilíbrio com o seu habitat natural. Nete também defende que eles têm o seu papel ecológico a ser desempenhado no ecossistema. Ela também menciona desequilíbrio causado por desmatamento e queimadas.
“As onças-pintadas, por exemplo, têm necessidades específicas de comida e não são adaptadas para viverem em local urbano, apesar de mudarem seus hábitos. Alguns desses animais vêm se aproximando cada vez mais perto de lavouras e pastos. Isso mostra, talvez, um desequilíbrio de seus habitats, com o desmatamento e grandes construções de áreas imobiliárias” declarou Moura, sobre casos em que os animais aparecem em áreas urbanas.
Carlos Machado, por outro lado, pontua que os ribeirinhos da Amazônia estão inseridos em um universo cultural que classifica como diferente das pessoas que estão vivendo em uma zona urbana. Ele chama a atenção para termos como silvestres e destaca que a humanidade é formada por “um conjunto de modos muito distintos dos humanos organizar seus mundos e conviver em coletivos”.
O especialista explica, ainda, que há uma diferença entre a domesticação de uma onça e uma capivara, não pelo fato de serem animais selvagens, mas porque o felino tem o potencial muito maior para realizar um ataque fatal contra o seu dono/xerimbabo. E a capivara, apesar de também ser silvestre, não apresenta esse risco de forma potencial.
“Existe diferença entre uma onça e uma capivara “domesticadas”. Porém, a diferença não passa por essa questão do instinto selvagem, ambos são igualmente selvagens. Portanto, a diferença está no potencial de uma onça atacar seu “dono/xerimbabo” em um momento de fúria, o que poderia ser fatal. Uma capivara, do mesmo modo, pode ficar furiosa e atacar seu dono, porém, seu potencial de fazer um ataque mortal é quase nulo”, frisou.

Nete Moura disse, ainda, que atualmente há oficinas em comunidades rurais de Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e Áreas de Proteção Ambiental (APAs) na Amazônia para conscientizar sobre a preservação de espécies ameaçadas de extinção. Isso, pontua a defensora, faz com que as famílias que moram nessas áreas tenham consciência sobre os danos que podem causar ao meio ambiente.
“Algumas famílias que possam querer criar uma onça, terão noção de perigo quando o animal estiver adulto e, podem sofrer ataque. Algumas áreas como as RDSs, Apas, Parques Nacionais, já existem informações para as populações moradores dessas áreas, como oficinas de conscientização e sensibilização para a preservação das espécies, já com grande ameaça de serem extintas no Brasil devido à caça ilegal, queimadas criminosas e consequentemente o aumento de desmatamento”, finalizou.
Dia Nacional dos Animais
O Dia Nacional dos Animais é celebrado nesta sexta-feira, 14, desde 2005, quando um grupo de entidades da sociedade civil que atuam em prol da proteção animal decidiu pela criação da data. Entre os principais objetivos desse dia é enaltecer a importância deles para humanidade, além de reconhecer que eles são sujeitos que possuem direitos garantidos na legislação vigente no País.
Legislação
No Brasil, a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) proíbe a posse, transporte, comercialização e utilização de animais silvestres sem a autorização. A infração está prevista no artigo 29 da Lei Nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, que trata dos crimes ambientais e contra a fauna. No entanto, a lei vigente não proíbe expressamente a criação do animal.
De acordo com a legislação, o crime ocorre quando a pessoa “mata, persegue, caça, apanha, utiliza espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida”.
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Editado por Izaías Godinho
Revisado por Gustavo Gilona
Fonte: Agência Cenarium